sábado, 25 de dezembro de 2010

Aos Sentimentos Mortos

             É lógico que eu sabia que pensar positivamente sobre isso não passava de um engano. E eu não costumo me enganar assim.
            Mas é mais do que incontestável que a verdade é, sim, a que eu enxergo com meus olhos impiedosos; a verdade que dói, que causa maus sentimentos e que, mais que tudo, permanece. A verdade que outros olhos amados não vêem; a verdade que não é secretamente doce, mas notavelmente amarga. Não usaria de eufemismos ou delicadezas para explorar tal realidade. Não usaria de falsas certezas ou consciências benignas para restaurar a afeição que já morre. Sei muito bem reconhecer a efemeridade das coisas e a imutabilidade da morte. E sei muito bem diferir um sentimento moribundo de um cadáver inerte, preso em ataúde selado a ferro e fogo.
            Portanto, caro amado, não me digas que tu sabes de verdade o que sentem por mim. Não me digas que tu sentes que há verdade alguma nisso. São corpos já há muito enterrados, e para suas chagas não há esperança. Deixe que eu cuide de meu cemitério de sentimentos esvaídos, de minha mortalha de flores murchas.
            E uma coisa esperem de mim, meus finados: não me verão cabisbaixa a rastejar por teus passos; não me verão semi-morta a pedir por teus beijos; não me verão deplorável a suplicar por teus encantos. Aquele que a mim diz ‘adeus’ de partida está. E a este eu deixo seu futuro, e o meu a mim.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Perdão

Se apenas em ti encontro a felicidade, como poderia deixar de perdoar-te? Não seria tolo desperdiçar uma vida ao teu lado apenas pelas feridas que tu me desferiste, como se a dormência do tempo fosse superior àquelas que talvez sofrerei novamente ao perdoar-te? Não estaria então ganhando o prazer que tanto almejo, aquele que nasce a teu lado, assim como o divino direito mais irreal de apagar os borrões de nossas histórias? Não estaria poupando-te da culpa, concedendo-te alívio? Não me regozijaria apenas, mas também perpetuaria tal alegria a outrem, e principalmente, àquele que mais me importa?Não, não é supremo o meu perdão;ele não é de todo altruísta, pelo contrário, há unicamente por mim. Porque somente saciarei meu espírito se ele encontrar-se no teu; apenas esquecerei teus erros por necessitar desta cegueira; apenas voltarei a teu lado por amor à minha existência; apenas darei tal clemência por não resistir à tua falta.
            Mas apenas se me cativas, e cativas além de minha própria pessoa. Pois a ela, a maior vítima de tuas chacinas, eu devo toda a existência anterior a ti; e cuidas para que eu não sinta novamente a alegria daqueles tempos, para que eu não vislumbre os passos perfeitos de outrora.
            Talvez,se isto acontece, eu esqueço a tua falta,a tua dor, e a guardo em algum lugar obscuro demais para ser encontrada. Talvez, se isto acontece, eu caio de amores por outro alguém. Alguém que estará imutavelmente por perto, não importa o quanto perdida ou machucada, que sempre será forte mesmo após caminhar pelo vale das sombras mais negras, e ao mesmo tempo leve, sorridente e bela. Esta pessoa eu posso amar mais do que a ti, e aí estaria tua ruína: esta pessoa sou eu”.